Quando falamos em violência contra a mulher é muito comum pensarmos em violência física. Logo nos vem à cabeça a imagem de uma mulher agredida fisicamente pelo companheiro dentro de uma situação de violência doméstica. Contudo, a violência física não é a única forma de violência que assombra as mulheres, muitas outras formas de violência existem e algumas delas nós sequer conhecemos ou apenas iremos saber que já fomos vítimas anos depois. A Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) responsável por coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil traz em seu Artigo 7º cinco formas de violência contra a mulher. Apesar da Lei Maria da Penha não trazer a tipificação penal da conduta, grande parte das ações que constituem formas de violência contra a mulher são crime. Assim, o agressor pode ser criminalmente responsabilizado por praticar alguma dessas formas de violência. Listamos aqui alguns dos crimes mais comuns que constituem forma de violência contra as mulheres, a definição do que pode ser entendido como cada forma de violência e seus respectivos exemplos

Violência Física

Art. 7º, I, Lei Maria da Penha: Entendida como qualquer conduta que ofenda a integridade ou saúde corporal da mulher.

São formas de violência física: empurrões, tapas, puxões de cabelo, socos, pontapés e todas as outras formas de agressão física.

A violência física é considerada crime quando a integridade corporal ou a saúde da mulher é ofendida (crime de lesões corporais, Artigo 129 do Código Penal). Sendo que se a violência for cometida dentro do contexto de violência doméstica, a pena é aumentada e pode chegar a até 3 anos (Artigo 129, §9º Código Penal).

Violência Psicológica

Art. 7º, II, Lei Maria da Penha: Entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação.

São exemplos de violência psicológica: o crime de ameaça, a prática de stalking, gasligthing, entre outros.

A violência psicológica é considerada crime previsto no Artigo 147-B do Código Penal e possui pena de reclusão que pode chegar de 6 meses a 2 anos.

Violência Sexual

Art. 7º, III, Lei Maria da Penha: Entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos.

São exemplos de violência sexual: estupro (incluindo aqueles dentro de um relacionamento) e estupro de vulnerável, divulgação de cena de sexo, importunação sexual, registro não autorizado da intimidade sexual, aborto forçado entre outros.

A violência sexual pode assumir a face de diversos crimes dentro do Código Penal, um dos mais comuns deles é o crime de estupro previsto no Artigo 213 do Código Penal em que a pena pode variar de 6 a 30 anos a depender da gravidade da conduta. Outro crime que configura violência sexual é o de importunação sexual previsto no Artigo 215-A do Código Penal, em que, algum ato libidinoso é praticado contra a vítima para satisfazer a lascívia (libido) do agressor. A pena pode ser de 1 a 5 anos se o fato não constituir crime mais grave.

Violência Patrimonial

Art. 7º, IV, Lei Maria da Penha: Entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades.

Configuram formas de violência patrimonial: controle do cartão de crédito e do dinheiro a ser utilizado, uso do dinheiro da mulher sem sua autorização, proibição que a mulher realize compras ou então venda artigos, alienação dos bens no momento do divórcio para que a mulher não tenha acesso a nada, destruição de instrumentos de trabalho, proibição que a mulher trabalhe, não pagamento da pensão alimentícia arbitrada em benefício da mulher, entre outros.

Um dos crimes que pode configurar violência patrimonial é o crime de furto (Artigo 155 do Código Penal), incorrendo nessa conduta tanto o cônjuge quanto o companheiro que subtrai às escondidas valores da mulher, bem como aquele que subtrai da mulher a parte que lhe cabia dos bens.

A violência patrimonial também pode assumir a face do crime de dano (Artigo 163 do Código Penal), quando a mulher tem algum bem próprio destruído ou deteriorado pelo seu agressor. Nos casos em que a mulher tem seus documentos destruídos, estamos tratando do crime de destruição, supressão ou ocultação de documentos, condutas estas sancionadas com pena de reclusão, de 2 a 6 anos, e multa, se o documento é público, e de 1 a 5 anos de reclusão, se o documento é particular.

No que se refere, especificamente, à ocultação (ou retenção) de documentos, se essa conduta impossibilitar o exercício de qualquer direito trabalhista pela mulher, tem-se caracterizado, ainda, o crime de frustração de direito assegurado por lei trabalhista, previsto no artigo 203 do CP, com pena de detenção de 1 ano a 2 anos e multa.

Violência Moral

Art. 7º, V, Lei Maria da Penha: “Entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. São formas de violência moral: acusar a mulher de traição, emitir juízos morais sobre sua conduta, fazer críticas mentirosas, expor a vida íntima da vítima, rebaixar a mulher por meio de xingamentos que incidem sobre a sua índole, desvalorizar a vítima pelo seu modo de se vestir.”

Como a própria definição da violência moral já diz, a violência moral pode assumir as formas dos crimes de calúnia (Artigo 138 do Código Penal) quando a prática de um falso crime é imputada à mulher; difamação (Artigo 139 do Código Penal) quando a reputação da mulher é ofendida e injúria (Artigo 140 do Código Penal) quando a dignidade e o decoro da mulher são ofendidos.

Caso você tenha sido vítima de alguma dessas violências, não deixe de entrar em contato com uma advogada especialista em questões de gênero que possa te orientar e dar o tratamento adequado para o seu caso, entendendo a complexidade e lidando de maneira empática com a situação.

Todas as formas de violência contra a mulher devem ser profundamente repudiadas e como sociedade devemos trabalhar todos os dias para que essas formas de violência deixem de existir.

Autora: Beatriz Vendramini Rausse. Sócia fundadora da Borguezi e Vendramini Advogadas Associadas. Mestre em Direito Europeu pela Universidade de Leiden, Holanda, com foco em entender perspectivas de gênero tanto no continente Europeu quanto Americano. Advogada devidamente inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil e Portugal.